*_O fato de que em apenas seis meses de governo a presidente Dilma
Rousseff tenha tido que afastar dois ministros importantes, herdados do gabinete de seu antecessor Luiz Inácio Lula da Silva (o da Casa Civil da
Presidência, Antonio Palocci – uma espécie de primeiro-ministro – e o dos
Transportes, Alfredo Nascimento), ambos caídos sob os escombros da
corrupção política, tem feito sociólogos se perguntarem por que neste país,
onde a impunidade dos políticos corruptos chegou a criar uma verdadeira
cultura de que “todos são ladrões” e que “ninguém vai para a prisão”, não
existe o fenômeno, hoje em moda no mundo, do movimento dos
indignados.Será que os brasileiros não sabem reagir à hipocrisia e à falta de ética de
muitos dos que os governam? Não lhes importa que tantos políticos que os
representam no governo, no Congresso, nos estados ou nos municípios
sejam descarados salteadores do erário público? É o que se perguntam não poucos analistas e blogueiros políticos.
Nem sequer os jovens, trabalhadores ou estudantes, manifestaram até
agora a mínima reação ante a corrupção daqueles que os governam.Curiosamente, a mais irritada diante do saque às arcas do Estado parece
ser a presidente Rousseff, que tem mostrado publicamente seu desgosto
pelo “descontrole” atual em áreas do seu governo e tirou literalmente –
diz-se que a purga ainda não acabou – dois ministros-chave, com o
agravante de que eram herdados do seu antecessor, o popular ex-
presidente Lula, que teria pedido que os mantivesse no seu governo.
A imprensa brasileira sugere que Rousseff começou – e o preço que terá
que pagar será elevado – a se desfazer de uma certa “herança maldita” que não fazem eco ressuscitando também aqui o movimento dos
de hábitos de corrupção que vêm do passado. E as pessoas das ruas, por
indignados? Por que não se mobilizam as redes sociais?
O Brasil, que, motivado pela chamada marcha das Diretas Já (uma
campanha política levada a cabo durante os anos 1984 e 1985, na qual se
reivindicava o direito de eleger o presidente do país pelo voto direto), se
lançou nas ruas contra a ditadura militar para pedir eleições, símbolo da
democracia, e também o fez para obrigar o ex-presidente Fernando Collor
de Mello (1990-1992) a deixar a Presidência da República, por causa das
acusações de corrupção que pesavam sobre ele, hoje está mudo ante a
corrupção.
As únicas causas capazes de levar às ruas até dois milhões de pessoas são
a dos homossexuais, a dos seguidores das igrejas evangélicas na
celebração a Jesus e a dos que pedem a liberalização da maconha.
Será que os jovens, especialmente, não têm motivos para exigir um Brasil
não só mais rico a cada dia ou, pelo menos, menos pobre, mais corrupto em suas esferas políticas, mais justo, menos desigual, onde um
desenvolvido, com maior força internacional, mas também um Brasil menos
vereador não ganhe até dez vezes mais que um professor e um deputado cem vezes mais, ou onde um cidadão comum depois de 30 anos de
trabalho se aposente com 650 reais (300 euros) e um funcionário público
com até 30 mil reais (13 mil euros).
O Brasil será em breve a sexta potência econômica do mundo, mas segue
atrás na desigualdade social, na defesa dos direitos humanos, onde a
mulher ainda não tem o direito de abortar, o desemprego das pessoas de cor é de até 20%, frente a 6% dos brancos, e a polícia é uma das que mais
matam no mundo.
Há quem atribua a apatia dos jovens em ser protagonistas de uma
renovação ética no país ao fato de que uma propaganda bem articulada os
teria convencido de que o Brasil é hoje invejado por meio mundo, e o é em
outros aspectos. E que a retirada da pobreza de 30 milhões de cidadãos
lhes teria feito acreditar que tudo vai bem, sem entender que um cidadão
de classe média europeia equivale ainda hoje a um brasileiro rico.
Outros atribuem o fato à tese de que os brasileiros são gente pacífica,
pouco dada aos protestos, que gostam de viver felizes com o muito ou o
pouco que têm e que trabalham para viver em vez de viver para trabalhar.
Tudo isso também é certo, mas não explica que num mundo globalizado –
onde hoje se conhece instantaneamente tudo o que ocorre no planeta,
começando pelos movimentos de protesto de milhões de jovens que
pedem democracia ou a acusam de estar degenerada – os brasileiros não
lutem para que o país, além de enriquecer, seja também mais justo, menos
corrupto, mais igualitário e menos violento em todos os níveis.
Este Brasil, com o qual os honestos sonham deixar como herança a seus
filhos e que – também é certo – é ainda um país onde sua gente não
perdeu o gosto de desfrutar o que possui, seria um lugar ainda melhor se
surgisse um movimento de indignados capaz de limpá-lo das escórias de
corrupção que abraçam hoje todas as esferas do poder.
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